Cherreads

Chapter 11 - Segredos e Encontros.

Pouco tempo antes da chegada de Lucius e Elian à mansão, Albert mantinha uma conversa reservada com Margareth no salão principal.

— Então finalmente aceitastes um novo aprendiz, Mestra Margareth? — indagou Albert com genuíno interesse.

— Sim, Albert — respondeu Margareth com voz medida —, e por favor, ainda que compartilhemos o vínculo sagrado entre Mestre e Discípulo, não podeis esquecer que atualmente ocupais a posição de Conde, enquanto eu tive meus títulos oficialmente revogados. Fui rebaixada à condição de Arquimaga.

— Mesmo assim, mestra... — Enquanto Albert tentava apresentar alguma objeção às suas palavras, Margareth o interrompeu com firmeza.

— Ainda assim, o fato permanece inalterado. Fui rebaixada. Recordai-vos do que perpetrei durante o conflito.

— Ao menos permiti-me dirigir-me a vós como mestra quando estivermos em privacidade — solicitou Albert com deferência.

Margareth exalou um suspiro profundo antes de responder:

— Muito bem. Quando estivermos completamente a sós, podeis utilizar tal tratamento. Entretanto, não vos esqueçais: quando qualquer outra pessoa estiver presente — mesmo que seja um membro de vossa própria família — deveis referir-vos a mim simplesmente como Margareth. Compreendido?

Albert assentiu respeitosamente, voltou-se para Belle e instruiu com seriedade:

— Belle, este assunto deve permanecer em absoluto sigilo. Não o compartilheis com ninguém. Nem mesmo com vossa mãe.

Belle compreendeu perfeitamente a gravidade da solicitação paterna. Estava plenamente consciente do profundo respeito e admiração que seu pai nutria por sua antiga mentora.

— Mestra, perdoai-me a indiscrição... — Albert hesitou momentaneamente antes de prosseguir —, por qual razão aceitastes outro discípulo, tendo anteriormente declarado que jamais acolheríeis outro aprendiz? Ocorreu algo significativo que vos fez reconsiderar tal decisão?

— Trata-se de uma questão extremamente pessoal... contudo, creio que posso compartilhá-la convosco. Poderíeis solicitar que Belle se retire para outro aposento? Não considero apropriado que ela ouça esta narrativa. Talvez, no futuro, ela possa compreender as circunstâncias envolvidas.

Albert concordou prontamente, voltou-se para sua filha e pediu que se retirasse. Poucos instantes depois, uma das serviçais da mansão conduziu a jovem a outro compartimento da residência.

— Tendes conhecimento parcial sobre meu passado, não é verdade, Albert? — inquiriu Margareth. Ele confirmou com um gesto discreto. — Então certamente recordais que experimentei a morte... por alguns segundos. Para ser absolutamente precisa, por pouco mais de sessenta segundos.

Ela fez uma pausa significativa, sorveu um gole do chá que uma das criadas havia servido momentos antes da saída de Belle, e então prosseguiu:

— Com Elian, a situação foi semelhante. Porém... consideravelmente mais grave. Elian, na realidade, nasceu completamente sem vida. Eu estava presente. Testemunhei pessoalmente. Ele permaneceu em estado de morte clínica por cinco minutos inteiros, Albert. Cinco. Não existe explicação científica ou arcana para tal fenômeno. E o único precedente documentado de alguém que retornou desse estado... é o meu próprio caso.

Margareth silenciou por um momento. Seu olhar perdeu o foco, como se revisitasse uma memória distante e perturbadora. Quando retomou a palavra, sua voz carregava uma emoção contida, mas perceptível.

— O corpo dele apresentava-se completamente gélido, Albert. Compreendeis o significado disso? — Ele assentiu gravemente. — Após um intervalo tão prolongado sem sinais vitais, seria absolutamente impossível que sobrevivesse. As artes arcanas, por mais poderosas que sejam, não possuem onipotência. Podem temporariamente suspender o processo da morte, adiar o inevitável... mas não têm o poder de trazer alguém verdadeiramente de volta. No máximo, conseguem evitar a transição final.

Ela inspirou profundamente, sua voz ligeiramente embargada pelas recordações vívidas.

— Albert... naquele dia, presenciei um autêntico milagre. Não possuo palavras adequadas para descrever o ocorrido. Ignoro se foi mera casualidade, desígnio do destino, ou intervenção de natureza divina. Mas foi, indubitavelmente, um milagre em sua essência mais pura. Maria derramava lágrimas inconsoláveis... e eu me consumia em culpa. Culpava-me por não ter chegado em tempo hábil, por não ter conseguido salvar aquela criança inocente. Meu único desejo naquele momento era poder retroceder no tempo.

Margareth fixou seu olhar diretamente nos olhos de Albert, com intensidade e seriedade impressionantes.

— E então, após cinco minutos de absoluto desespero... ele emitiu um choro. Mas não era o choro característico que anuncia o início da vida. Era um choro carregado de dor, de profundo arrependimento. Não me questioneis sobre como obtive tal percepção. Simplesmente... senti. — Ela suspirou lenta e pesadamente. — E imediatamente depois, veio a sensação de alívio. Não apenas dele. Da mãe. Do pai. E também de mim mesma.

Aquela experiência extraordinária deixou uma marca indelével em sua consciência. Não meramente por sua natureza incomum, mas porque despertava nela sensações inexplicáveis — reminiscências cuja origem ela própria desconhecia.

— Foi esse o motivo que vos levou a aceitá-lo como aprendiz? — perguntou Albert.

— Não. Não foi essa a razão determinante. Naquele dia, ao examiná-lo minuciosamente, constatei que seu organismo estava em perfeitas condições. Absolutamente intacto. Mas isso contrariava todas as leis naturais. Nenhum ser humano sobrevive a cinco minutos de privação completa de oxigênio sem apresentar sequelas neurológicas permanentes. Absolutamente ninguém. — Ela tomou outro gole de chá, seus dedos apresentando um leve tremor, antes de continuar. — O que efetivamente me persuadiu a aceitá-lo... ocorreu dois anos depois, durante o nascimento de sua irmã, Vivian.

Albert arregalou os olhos em evidente surpresa. Margareth esboçou um sorriso — não de alegria, mas carregado de pesar e profundo respeito.

— Ele manifestou o despertar como uma Centelha. Aos meros dois anos de idade.

— Uma Centelha...? — Albert parecia dividido entre o espanto e a incredulidade.

— Precisamente. O mesmo estágio arcano que eu própria alcancei, mas somente aos quatro anos de idade... e apenas após a traumática perda de minha mãe. Ele, por outro lado, despertou ao simplesmente segurar sua irmã recém-nascida nos braços. — Margareth inclinou-se ligeiramente para frente, sua voz quase reduzida a um sussurro confidencial. — Albert... podeis conceber que aquela criança irradiou um sentimento absolutamente puro de proteção? Um impulso instintivo e primordial de proteger outro ser com a totalidade de sua alma?

Ela recostou-se novamente, encarando-o com expressão de gravidade incontestável.

— Que tipo de criança, com apenas dois anos de idade, reage ao nascimento de uma irmã como se estivesse pronunciando um juramento solene de protegê-la com a própria existência?

Até o presente momento, Margareth continuava a questionar-se sobre a origem daquele poderoso instinto protetor que Elian manifestava. Era algo completamente irracional para uma criança daquela idade. Um fenômeno que, por todas as leis naturais... simplesmente não deveria existir.

— Lucius ajoelhou-se humildemente diante de mim, implorando para que eu aceitasse seu filho como aprendiz. Minha inclinação inicial era recusar categoricamente. Na verdade, estava absolutamente decidida a recusar — afinal, estais plenamente ciente de que ele poderia ser formalmente excomungado tanto pela Nobreza Arcana quanto pela aristocracia de Sangue-Puro, por estabelecer vínculo comigo. — Ela fez uma pausa significativa, seu olhar momentaneamente perdido em recordações. — Entretanto, Maria, ainda exausta pelo recente parto, adotou a mesma postura suplicante. E, apesar de toda minha relutância inicial... acabei cedendo. Não por consideração a eles. Mas por algo inexplicável que nasceu dentro de mim naquele preciso instante. Algo que transcende minha própria compreensão.

Albert observava Margareth com atenção meticulosa. Pela primeira vez durante aquela conversa, percebeu um peso visível abandonando os ombros dela. Um suspiro que parecia ter permanecido contido por incontáveis anos.

— Agora compreendo plenamente... — comentou ele com suavidade. — Vós reconhecestes a vós mesma nele. E foi por essa razão que o aceitastes, mesmo consciente dos riscos envolvidos, mesmo sabendo que ele poderia enfrentar rejeição por parte da sociedade aristocrática.

— Exatamente. — Margareth confirmou, com um sorriso melancólico adornando seus lábios.

— Mas... ele já possui conhecimento? Sobre os supostos “crimes” pelos quais vos acusaram?

— Ainda não. — Sua expressão adquiriu uma seriedade acentuada. — Ainda não é o momento apropriado para uma criança assimilar tais informações. Quando o momento adequado chegar, ele será devidamente instruído.

Um silêncio significativo estabeleceu-se entre eles. Denso, porém não desconfortável. Como se as palavras trocadas tivessem cumprido plenamente sua função comunicativa.

— Essa é a explicação completa. — concluiu ela finalmente. — Respondi satisfatoriamente à vossa indagação?

— Sim, Mestra. — Albert inclinou respeitosamente a cabeça. — Agradeço sinceramente por esclarecer minha dúvida.

Ele ergueu-se e ajustou suas vestimentas com dignidade característica.

— Devo retirar-me agora. Agradeço pela hospitalidade... e por esta conversa esclarecedora. Espero que, em breve, possa conhecer formalmente vosso novo discípulo. Ou melhor, meu júnior na linhagem de aprendizado. — acrescentou com um discreto sorriso.

— Ele chegará em breve. Hoje marca seu retorno aos estudos. Concedi-lhe uma semana de merecido descanso. Foram dez meses de treinamento excepcionalmente intenso... e ele já conseguiu acumular vinte e cinco por cento da capacidade total da Runa.

Albert arqueou as sobrancelhas em evidente surpresa.

— Vinte e cinco por cento? Em apenas dez meses de treinamento? Isso é... verdadeiramente extraordinário. Eu próprio necessitei de aproximadamente um ano e meio para atingir tal patamar. — comentou com um leve tom de admiração mesclada a inveja benevolente.

— Ah, Albert, não vos deixeis abater por comparações. Vossa filha, Belle, também demonstrou notável rapidez em seu desenvolvimento. Qual foi precisamente o período? Onze meses, se não me falha a memória?

Albert riu discretamente e assentiu, com orgulho paterno claramente visível em sua expressão.

— Ela possui talento comparável ao de Elian. — acrescentou Margareth, com sinceridade evidente.

— Bem, Mestra... é chegado o momento de minha partida. Reitero meus agradecimentos por receberdes a mim e à minha filha com tanta cordialidade. Tenho plena consciência de que esta visita, oficialmente, cumpria apenas formalidades exigidas pelo Reino... mas desejo que saibais: jamais duvidei, e jamais duvidarei de vossa integridade.

— Sou profundamente grata, Albert. — respondeu ela com voz firme, embora visivelmente emocionada. — Vossas palavras possuem valor inestimável para mim.

Albert retirou-se da sala onde mantivera a conversa com Margareth. Dirigiu-se ao aposento adjacente e chamou Belle, que o aguardava em silêncio respeitoso. Juntos, encaminharam-se para a entrada principal da mansão.

Ao abrir a imponente porta de madeira ricamente entalhada, Albert avistou duas figuras aproximando-se lentamente pela trilha pavimentada com pedras. Um homem adulto e uma criança.

“Seriam Lucius e Elian, os indivíduos mencionados pela Mestra?” — refletiu Albert, observando-os atentamente.

Belle, posicionada ao lado de seu pai, também fixou seu olhar nos recém-chegados com evidente curiosidade.

O homem apresentava estatura considerável, trajava uma túnica de tonalidade azul-escura confeccionada em lã de qualidade superior, complementada por calças do mesmo material que se estendiam até os tornozelos. Um resistente cinto de couro ajustava a túnica à sua cintura. Sobre os ombros, um manto de aparência simples, porém digna, caía com naturalidade. Suas botas, embora exibissem sinais evidentes de uso prolongado, mantinham-se em estado satisfatório de conservação.

Seu semblante era marcado por traços fortes e definidos. Era, indubitavelmente, o rosto de um nobre — não daqueles criados entre o luxo e o conforto de salões palacianos, mas um nobre forjado nas adversidades do campo, possivelmente temperado em batalhas e provações. Aparentava aproximadamente vinte e cinco anos de idade. Seus olhos, de um castanho-claro que transmitia serenidade, contrastavam harmoniosamente com seus cabelos escuros, de um negro com reflexos azulados que resplandeciam sob a luz solar.

A criança que o acompanhava vestia-se de maneira semelhante, com uma distinção notável: em substituição ao manto, utilizava um sobretudo de cor azul-escura que cobria quase integralmente seu corpo de proporções diminutas. Aparentava ter pouco menos de três anos de idade. Seus cabelos, de um loiro dourado reminiscente de trigo maduro, apresentavam-se impecavelmente penteados, caindo suavemente até quase alcançar os ombros. Seus olhos, de um dourado intenso e vívido comparável ao ouro recém-polido, cintilavam sob a luminosidade matinal.

Tratavam-se, efetivamente, de Lucius Freimann e seu filho, Elian Freimann.

Lucius aproximou-se da entrada e executou uma reverência formal impecável. Elian, com surpreendente graciosidade para sua idade, reproduziu o gesto paterno com precisão.

— Vossa Senhoria, Lorde Stein. — pronunciou Lucius, com deferência apropriada.

— Sir Lucius. — respondeu Albert, com um discreto aceno de reconhecimento. — Margareth... esta criança é vosso novo discípulo?

— Sim, Milorde. — confirmou Margareth com serenidade característica.

Belle, que até aquele momento observava Elian em silêncio contemplativo, foi convocada por seu pai a apresentar-se formalmente.

— Meu nome é Belle Von Stein, primogênita de Albert Von Stein. É uma honra conhecê-lo. — declarou com um leve movimento de cabeça e voz surpreendentemente firme para sua tenra idade.

Interiormente, contudo, Belle experimentava uma confusão de sensações inexplicáveis. Algo naquela criança despertava sua intensa curiosidade. Os olhos dourados de Elian pareciam exercer sobre ela uma atração magnética incomparável a qualquer outra coisa presente naquele ambiente. Belle havia recentemente completado cinco anos de idade. E, assim como Elian, também já havia alcançado o impressionante marco de vinte e cinco por cento da capacidade da Runa no estágio da Centelha. Não obstante, havia algo de profundamente enigmático e inexplicável naquela criança diante dela.

Elian a observou com evidente curiosidade, inclinando ligeiramente a cabeça em gesto inquisitivo.

— Há algo que vos perturba? — indagou, com uma voz clara e surpreendentemente articulada para alguém de sua idade cronológica.

Belle quase recuou instintivamente, tomada de surpresa. Porém, rapidamente recuperou sua compostura e negou com um movimento de cabeça, tentando dissimular seu espanto.

— N-não... absolutamente nada.

Entretanto, em seu íntimo, ela tentava compreender como uma criança de aproximadamente três anos conseguia expressar-se com tamanha clareza e demonstrar uma presença tão marcante quanto a dela própria, que já havia completado cinco anos.

— Vamos, Belle. — chamou Albert. — Teremos outras oportunidades de encontro, Lucius. Elian.

Enquanto caminhava ao lado de seu pai, Belle experimentava uma inquietação indefinível. Uma sensação de desconforto sutil, porém persistente. Seria apreensão? Curiosidade? Ela própria não conseguia identificar com precisão. Apenas tinha consciência de que algo fundamental havia se transformado em sua percepção.

Antes de adentrar a elegante charrete, voltou seu olhar uma última vez. E lá permanecia Elian, imóvel, observando-a diretamente. Seus olhares se cruzaram — pela segunda vez naquela manhã significativa.

Então, algo inesperado e inexplicável ocorreu.

Um sorriso espontâneo floresceu em seus lábios.

Ela não conseguia explicar racionalmente a origem daquele gesto ou sua motivação. Era um sorriso genuíno, desprovido de artifícios, quase radiante em sua simplicidade. Um sorriso que, com o transcorrer do tempo... talvez evoluísse para algo de significado mais profundo.

Belle acomodou-se ao lado de seu pai na carruagem, ajustou seu vestido com um movimento automático e, momentos antes que as rodas iniciassem seu movimento, formulou um pensamento definido:

— Nos encontraremos novamente, Elian Freimann...

More Chapters