Os olhos de Belle brilhavam intensamente enquanto ela observava um duelo simulado entre dois alunos mais velhos, um usando chamas na lâmina, o outro movendo-se com agilidade elétrica. Vi o desejo de estar ali, de aprender mais, de aprimorar suas próprias habilidades. Ela estava completamente encantada.
Em seguida, fomos para uma sala adjacente, a “Sala de Conjuração Tática”. O foco aqui era diferente. Vimos alunos praticando feitiços ofensivos contra alvos flutuantes, erguendo barreiras defensivas de diferentes elementos e até mesmo trabalhando em duplas para combinar seus poderes.
— Enquanto os Espadachins buscam a integração, os Arcanistas focados em combate e defesa aprimoram o controle elemental puro e a aplicação estratégica — explicou o Diretor Aldebrand. — Aqui, eles aprendem a maximizar o poder de seus feitiços, a gerenciar sua mana eficientemente em situações de pressão, a criar defesas impenetráveis, a explorar as fraquezas elementais dos oponentes e a desenvolver contra-feitiços. O objetivo é formar Arcanistas capazes de controlar o campo de batalha, seja na linha de frente ou na retaguarda.
Senti um arrepio de interesse. Aquilo era o que eu buscava. Controle, poder, estratégia. Ver aqueles alunos manipulando Fogo, Terra, Água e Ar com tanta precisão e intensidade me fez ansiar pelo dia em que eu poderia fazer o mesmo, talvez até superá-los com minha afinidade tripla e minha recém-criada Fulmínea da Ira Ígnea.
Nossa última parada no tour interno foi em uma área mais barulhenta e quente: a “Forja Rúnica”. O som de martelos batendo em metal ecoava pelo corredor antes mesmo de entrarmos. Lá dentro, vimos ferreiros habilidosos trabalhando em forjas que ardiam com chamas arcanas coloridas, moldando metais brilhantes enquanto outros artesãos, com ferramentas delicadas, gravavam runas complexas em lâminas de espadas, peças de armadura e até mesmo em joias.
— Uma arma ou armadura comum pode proteger o corpo, mas uma peça rúnica pode ampliar a alma — disse o Diretor, sua voz ligeiramente elevada para superar o ruído. — Aqui, na Forja Rúnica, nossos artesãos aprendem a arte ancestral de imbuir objetos com poder arcano. Eles estudam as propriedades dos metais mágicos, os segredos das runas de poder, e como harmonizar a energia de um item com seu portador. Uma espada rúnica bem-feita pode canalizar os feitiços de um Espadachim Arcano com mais eficiência, ou uma armadura rúnica pode oferecer proteção contra ataques elementais. É uma arte que exige tanto habilidade manual quanto um profundo entendimento arcano.
Fiquei fascinado. A ideia de criar minhas próprias armas, imbuídas com meu próprio poder, talvez até com runas ligadas à minha Fulmínea da Ira Ígnea... Era uma perspectiva empolgante. Olhei para a espada de treino que meu pai me dera, aquela com runas de proteção. Agora eu entendia um pouco melhor a complexidade por trás daqueles símbolos.
O tour pelas salas havia sido esclarecedor e inspirador. Cada área mostrava uma faceta diferente do vasto mundo das artes arcanas, e eu podia sentir tanto em mim quanto em Belle um desejo crescente de mergulhar naquele universo de conhecimento e poder.
Após a Forja Rúnica, o Diretor Aldebrand nos guiou para fora, atravessando um pátio amplo em direção a uma área aberta ainda maior, cercada por arquibancadas de pedra e protegida por barreiras arcanas translúcidas que cintilavam levemente sob o sol: o Campo de Treinamento Principal.
Se o Ginásio de Esgrima Arcana era impressionante, este lugar era de uma escala completamente diferente. Era vasto o suficiente para acomodar dezenas de alunos treinando simultaneamente, com diferentes seções demarcadas por linhas de energia no chão – algumas para duelos individuais, outras para combates em grupo, e até mesmo áreas com obstáculos simulados, como rochas flutuantes e alvos móveis.
O ar aqui vibrava com uma intensidade ainda maior, uma cacofonia de energias elementais colidindo, o som de lâminas se chocando, explosões controladas e gritos de esforço. Paramos em uma plataforma de observação elevada, que nos dava uma visão panorâmica de toda a atividade.
O que vimos nos deixou, tanto a mim quanto a Belle, literalmente de boca aberta. Eram lutas simuladas, mas a intensidade e o nível de habilidade eram muito superiores a qualquer coisa que tínhamos experimentado em nossos treinos particulares.
Vimos um Espadachim Arcano envolto em chamas dançando ao redor de um Arcanista que erguia paredes de gelo e lançava estacas afiadas. Vimos um grupo de três alunos tentando subjugar um golem de pedra animado por um instrutor, combinando ataques de fogo, vento e terra em uma estratégia coordenada. Vimos dois Arcanistas em um duelo puramente elemental, trocando esferas de energia, escudos cintilantes e rajadas de poder em uma velocidade estonteante.
A precisão, a velocidade, a variedade de feitiços e técnicas... era avassalador. Mesmo treinando com Mestra Margareth, uma das Arcanistas mais poderosas do reino, e com meu pai e o Conde Albert, ambos guerreiros experientes, o que víamos aqui parecia pertencer a outro nível de combate.
— Eles... eles são incríveis — gaguejou Belle ao meu lado, seus olhos fixos em uma Espadachim Arcana que usava o Passus Aethereus com uma fluidez que fazia a própria Belle parecer lenta em comparação.
— Mesmo treinando com a Mestra e nossos pais... — comecei, tentando encontrar as palavras. — Nunca vi nada assim. A forma como eles combinam os ataques, a velocidade das conjurações...
Era humilhante e inspirador ao mesmo tempo. Percebi o quão longe eu ainda estava de dominar verdadeiramente minhas afinidades, o quão rudimentar era minha recém-criada “Fulmínea da Ira Ígnea” comparada à complexidade das interações que testemunhávamos. O treinamento na Academia não era apenas sobre aprender feitiços individuais; era sobre dominar a arte da batalha arcana em sua totalidade.
O Diretor Aldebrand observava nossa reação com um leve sorriso. — O treinamento aqui é rigoroso e desafiador. Empurramos nossos alunos aos seus limites e além. Mas é neste ambiente que o verdadeiro potencial floresce. A competição saudável, a troca de conhecimentos e a orientação de mestres experientes criam guerreiros e estudiosos de calibre excepcional.
Ficamos ali por vários minutos, absorvendo a energia e a habilidade demonstradas no campo abaixo. Aquele vislumbre das batalhas simuladas acendeu uma nova chama de determinação dentro de mim. Eu queria estar ali. Queria aprender, competir, superar meus limites e me tornar tão forte quanto aqueles alunos – ou ainda mais forte.
Após nossa visita ao impressionante Campo de Treinamento, retornamos à calma e estudiosa atmosfera do escritório do Diretor Aldebrand. Ele nos convidou a sentar novamente, e a quietude da sala pareceu ainda mais pronunciada depois da intensidade energética que havíamos testemunhado.
— Então — começou o Diretor, sentando-se atrás de sua mesa e juntando as pontas dos dedos —, o que acharam de nossa humilde instituição?
Antes que qualquer um de nós pudesse responder, Vivian, que estava sentada no colo de meu pai, balançando as perninhas, falou com a sinceridade desarmante de uma criança:
— Eu gostei da sala que cura! Tinha cheirinho bom!
Um sorriso genuíno iluminou o rosto do Diretor Aldebrand, e até meu pai e o Conde Albert riram baixinho. Meu pai afagou os cabelos de Vivian.
— Fico feliz que tenha gostado, querida — disse ele, orgulhoso. — Quem sabe um dia você não estuda lá também?
Vivian assentiu animadamente, embora eu duvidasse que ela entendesse completamente o significado daquilo. Ainda assim, o interesse dela pela cura, mesmo que superficial, pareceu agradar a todos.
— E vocês, Lady Isabelle, Lorde Elian? — perguntou o Diretor, voltando sua atenção para nós.
— Foi... incrível, Diretor — respondeu Belle, seus olhos ainda brilhando com a lembrança do Ginásio de Esgrima Arcana e do Campo de Treinamento. — A forma como os Espadachins Arcanos integram a lâmina e os feitiços... e as lutas no campo... É muito mais avançado do que eu imaginava.
— Concordo — acrescentei, pensando na Sala de Conjuração Tática e na Forja Rúnica. — A profundidade dos estudos, as diferentes especializações... e o nível de habilidade dos alunos no campo de treinamento... Foi inspirador. E um pouco intimidante.
O Diretor assentiu, compreensivo. — É natural sentir-se assim. A Academia existe para desafiar e inspirar. Fico satisfeito que tenham percebido o potencial que reside aqui.
Ele fez uma pausa, seu olhar tornando-se mais sério ao se fixar em Belle.
— Lady Isabelle, sua apresentação ontem foi notável. Enfrentar um Capitão da Guarda Real com sua idade, e demonstrar um controle inicial tão promissor sobre a arte divergente de sua família, o Corpus Fulminis... Isso demonstra não apenas talento, mas também coragem e uma disciplina incomum. Seu pai e seus instrutores fizeram um excelente trabalho.
Belle corou levemente com o elogio direto, murmurando um agradecimento.
Então, o Diretor virou seus olhos verdes penetrantes para mim.
— E Lorde Elian... o que vimos ontem foi algo verdadeiramente sem precedentes. Uma afinidade tripla confirmada, e uma arte arcana que deixou toda a corte, inclusive este velho diretor, completamente espantado. Aquela demonstração de poder bruto e controle elemental combinado... diga-me, como chama essa arte?
— Fulmínea da Ira Ígnea, Diretor — respondi, sentindo o peso de seu olhar avaliador.
— Fulmínea da Ira Ígnea... — repetiu ele, pensativo. — Um nome poderoso. E como você a desenvolveu? Foi instrução da Casa Stein, talvez, dada a natureza elétrica?
Hesitei por um momento. Olhei para Belle, que me observava com curiosidade. Era hora de ser honesto.
— Não, Diretor. Não foi ensinada pelos Stein — respondi. — Na verdade, a inspiração inicial veio ao ver Lady Isabelle treinar e usar o Corpus Fulminis.
Vi Belle arregalar os olhos, surpresa, e um leve rubor subir por seu pescoço. Ela me encarou, claramente pega de guarda pela revelação.
Continuei, explicando da melhor forma que pude: — Vendo a energia do raio dela, comecei a pensar se seria possível criar um efeito semelhante usando meus próprios elementos. Li alguns grimórios antigos sobre fenômenos naturais, como os raios vulcânicos, e percebi que eles envolviam uma combinação de Fogo, Terra e Ar. Passei algum tempo teorizando e, nos dias antes da Apresentação, consegui... encontrar uma forma de canalizar as três afinidades em sequência para gerar o raio.
O Diretor Aldebrand ouviu atentamente, seus dedos tamborilando suavemente sobre a mesa. Quando terminei, ele ficou em silêncio por um momento, seu olhar perdido em pensamentos.
— Extraordinário — disse ele finalmente, sua voz carregada de admiração. — Criar uma arte arcana completamente nova, baseada em observação, estudo e experimentação, com sua idade... Lorde Elian, seu potencial é imenso. Assim como o seu, Lady Isabelle.
Ele se inclinou para frente, seu olhar passando entre mim e Belle.
— É por causa desse potencial excepcional que os convidei aqui hoje. A Academia Arcana Real existe para nutrir talentos como os seus. Portanto, em nome da Academia e com a aprovação do Conselho de Mestres, tenho a honra de oferecer formalmente a ambos, Lady Isabelle Von Stein e Lorde Elian Freimann, um lugar em nossa instituição.
O convite formal. Ali estava. Senti um arrepio percorrer minha espinha, uma mistura de orgulho, excitação e uma pontada de medo. Olhei para Belle; ela parecia igualmente atordoada, mas seus olhos brilhavam com uma alegria inconfundível. Nossos pais sorriam, claramente satisfeitos e orgulhosos.
Era oficial. O caminho para a Academia estava aberto para nós.
O convite pairou no ar, carregado de promessas e de um futuro que, de repente, parecia muito mais próximo e real. Aceitar significava deixar para trás a relativa segurança de nossos lares e mergulhar de cabeça no ambiente exigente e competitivo da Academia.
Meu pai e o Conde Albert trocaram olhares, uma comunicação silenciosa entre homens que entendiam o peso daquela decisão. Foi o Conde Albert quem falou primeiro.
— Diretor Aldebrand, estamos imensamente honrados com a oferta. É um testemunho do potencial que o senhor vê em nossos filhos. No entanto, como deve saber, eles ainda são muito jovens...
— Compreendo perfeitamente, Conde — interrompeu o Diretor gentilmente. — E é justamente sobre isso que precisamos conversar.
O Diretor Aldebrand recostou-se em sua cadeira, seu olhar passando de meu pai para o Conde Albert, e então para mim e Belle.
— A idade padrão para ingresso na Academia Arcana Real é aos doze anos — explicou ele. — É a idade em que a maioria dos jovens Arcanistas e Espadachins Arcanos atingiu um nível de maturidade e controle básico sobre suas habilidades que lhes permite acompanhar nosso currículo intensivo. No entanto... — ele fez uma pausa, seus olhos verdes fixando-se em nós — ...em casos de talento excepcional, como os que testemunhamos ontem, o Conselho de Mestres tem a prerrogativa de oferecer admissão antecipada ou, inversamente, permitir um ingresso um pouco mais tardio, até os quatorze anos, para garantir que o aluno esteja verdadeiramente pronto, tanto em habilidade quanto em maturidade emocional.
Senti um nó se formar em meu estômago ao ouvir “doze anos”. Eu tinha apenas seis. Belle tinha oito. A diferença de idade, que antes parecia apenas um detalhe em nossos treinos, agora se tornava uma barreira potencial. Olhei para Belle e vi a mesma compreensão e uma sombra de tristeza cruzar seu rosto. Se a regra fosse rígida, ela entraria na Academia muito antes de mim.
— Entendemos que esta é uma decisão significativa para as famílias e, principalmente, para os jovens — continuou o Diretor. — Não exigimos uma resposta imediata. O convite está feito. Discutam entre si, considerem o ritmo de desenvolvimento de Lady Isabelle e Lorde Elian. A Academia estará pronta para recebê-los quando sentirem que é o momento certo, dentro da janela que mencionei. Deem-nos sua resposta quando estiverem preparados.
★★★
Naquela mesma tarde, de volta à relativa tranquilidade da Mansão Stein, encontrei Belle no jardim. O sol começava a baixar, pintando o céu com tons de laranja e rosa, e a brisa suave carregava o perfume das flores. Ela estava sentada em um banco de pedra sob um salgueiro-chorão, observando Vivian que tentava, sem muito sucesso, fazer um pequeno canteiro de flores flutuar usando uma imitação muito rudimentar de controle elemental.
Aproximei-me em silêncio e sentei-me ao lado dela. Por um tempo, ficamos apenas observando Vivian, perdidos em nossos próprios pensamentos sobre a visita à Academia e o convite do Diretor.
— Doze anos... — murmurou Belle finalmente, sua voz baixa, quase um sussurro. — Isso significa que... eu teria que ir daqui a quatro anos. E você... só daqui a seis.
Ela não olhou para mim, mas vi seus ombros caírem levemente. A guerreira confiante que enfrentara um Capitão Real no dia anterior parecia ter desaparecido, dando lugar a uma garota de oito anos confrontando a perspectiva de se separar de seu único amigo de verdade.
— Eu não quero ir antes de você, Elian — continuou ela, agora olhando para as próprias mãos em seu colo. — A Academia parece incrível, mas... ir sozinha... Você foi o primeiro amigo que eu tive que não se importava se eu era uma Von Stein ou se eu preferia treinar espada a bordar. Não quero... não quero ficar sem você lá.
Sua vulnerabilidade me pegou de surpresa. Apesar de toda a sua força e habilidade, apesar de ser dois anos mais velha, naquele momento, ela parecia apenas uma criança assustada com a ideia da separação. E, para minha própria surpresa, percebi que sentia o mesmo. A ideia de passar anos treinando, crescendo, enfrentando os desafios da Academia sem Belle ao meu lado... era um pensamento estranhamente vazio e desagradável.
Nós competíamos, discutíamos, nos provocávamos, mas também tínhamos nos apoiado. Ela me ajudou a lidar com a morte do bandido, eu a inspirei — mesmo sem saber — a buscar sua própria força. Tínhamos nos tornado uma constante na vida um do outro.
— Belle... — comecei, buscando as palavras certas. — Eu também não quero que você vá sozinha. E eu não quero entrar lá depois, sem você.
Ela levantou o olhar, surpresa, seus olhos âmbar encontrando os meus.
— Então... — continuei, a ideia se formando em minha mente, impulsionada por aquele sentimento mútuo de não querer a separação. — Que tal fazermos uma promessa? Nós dois. Entraremos na Academia juntos. Não importa se você tiver que esperar um pouco mais, ou se eu tiver que me esforçar para estar pronto antes. Entraremos por aqueles portões no mesmo dia.
A tristeza nos olhos de Belle desapareceu instantaneamente, substituída por um brilho intenso, quase elétrico, como o de seu Corpus Fulminis. Um sorriso largo e radiante se espalhou por seu rosto.
— Juntos? — repetiu ela, a voz cheia de esperança.
— Juntos — afirmei, estendendo minha mão para ela.
Ela não hesitou. Sua mão encontrou a minha, e apertamos as mãos com firmeza, selando nosso pacto ali, sob o salgueiro-chorão, com o sol se pondo no horizonte.
— Eu prometo, Elian — disse ela, seu sorriso inabalável.
— Eu também prometo, Belle — respondi, sentindo uma onda de calor e determinação me preencher.
Ficamos ali por mais um tempo, nossas mãos ainda unidas, observando Vivian finalmente conseguir fazer uma pequena margarida levitar — na verdade, ela assoprava para o ar — por alguns segundos antes de cair de volta na grama. O futuro na Academia ainda parecia distante e desafiador, mas agora, não parecia mais solitário.
Naquele momento, percebi o quanto eu havia me apegado a Belle. Ela não era mais apenas a rival de treino ou a filha do Conde. Ela tinha se tornado... alguém especial. Alguém por quem valia a pena esperar, ou lutar para alcançar. Alguém com quem eu queria enfrentar o futuro, lado a lado.