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Chapter 9 - Descanso em Família II.

Três dias transcorreram desde nossa visita ao vilarejo do feudo. Meu pai, contrariando sua habitual dedicação aos deveres senhoriais, decidiu conceder a si mesmo alguns dias de descanso para desfrutar da convivência familiar. Embora uma parte de mim considerasse que ele talvez devesse priorizar a recuperação dos habitantes adoecidos, não posso negar o quanto apreciava esse tempo precioso em família.

Aproveitando essa rara pausa em nossa rotina, resolvi esclarecer algumas dúvidas que persistentemente ocupavam meus pensamentos.

— Pai, o que exatamente significa ser um Baronete Arcano? — indaguei com genuína curiosidade.

Ele me fitou com evidente surpresa, claramente tentando compreender como uma criança de minha idade já demonstrava interesse por terminologias nobiliárquicas tão específicas. Percebendo seu desconcerto, minha mãe prontamente interveio:

— Expliquei a ele como nos conhecemos, as circunstâncias de nosso casamento... e mencionei também sua condecoração como Baronete Arcano.

— Ah, compreendo... — Ele fez uma breve pausa reflexiva, então abriu um sorriso levemente sarcástico e brincou: — Então você relatou como eu era excepcionalmente másculo, de beleza notável e postura mais nobre que a dos próprios duques?

Minha mãe respondeu com um sorriso igualmente irônico, mas carregado de afeto:

— Precisamente.

Ele então voltou-se para mim, assumindo uma expressão mais séria e ponderada:

— Talvez ainda seja um pouco prematuro para que você compreenda integralmente essas complexidades sociais. É possível que, com o passar dos anos, acabe por esquecer esta conversa.

Inspirou profundamente antes de prosseguir:

— Contudo, não há problema. Se eventualmente esquecer, terei prazer em explicar novamente.

Ergueu-se com determinação, dirigiu-se ao escritório e retornou trazendo consigo um tomo encadernado em couro. Folheou cuidadosamente algumas páginas até deter-se em uma ilustração que exibia um brasão de aparência relativamente simples, ornamentado em dourado e prateado, circundado por símbolos arcanos meticulosamente inscritos.

— Aqui está — indicou ele, apontando para a imagem com precisão. — Um Baronete Arcano representa o patamar inicial entre os nobres oficialmente reconhecidos como "portadores de poder arcano institucionalizado". Isso significa que não é suficiente apenas possuir conhecimento sobre as artes arcanas... é imperativo ter realizado algo de magnitude considerável para que o Reino formalmente reconheça tal mérito.

— Como, por exemplo... a conquista de um feudo? — perguntei, demonstrando interesse crescente.

Ele assentiu com um movimento afirmativo.

— Exatamente. Recebi esta distinção após a conclusão da guerra contra o Reino de Alafia. Consegui, com recursos limitados, defender dois vilarejos estratégicos sem assistência adicional, mantive uma linha de frente com efetivo inferior a cem homens... e, o mais significativo, derrotei em combate singular um praticante arcano classificado no nível Rugido. Tais feitos naturalmente atraíram a atenção da Coroa. Como reconhecimento, fui agraciado com este modesto feudo e o título correspondente de Baronete Arcano.

— Então foi essa a razão principal da indignação do vovô quando vocês formalizaram o noivado?

— Entre diversos outros fatores — respondeu ele, permitindo-se um breve momento de descontração.

Minha mãe revirou os olhos com expressão divertida, esboçando um sorriso discreto enquanto tomava assento ao meu lado.

— A realidade, Elian, é que muitos membros da nobreza tradicional demonstram profundo desagrado quando observam pessoas de origem comum ascendendo socialmente, mesmo quando tal ascensão ocorre por mérito indiscutível. Seu pai, antes dos eventos da guerra, era meramente um cavaleiro sem distinções hereditárias. Entretanto, sua excepcional habilidade com a espada... e sua notável aptidão para as artes arcanas... constituem talentos raramente encontrados mesmo entre os nobres de linhagem ancestral.

Meu pai, visivelmente desconfortável com os elogios recebidos, passou a mão pelos cabelos num gesto característico e complementou:

— Portar o título de Baronete Arcano implica em significativas responsabilidades. Respondo diretamente à autoridade da Coroa, assumo obrigações de natureza fiscal, militar e arcana. Devo proporcionar treinamento adequado aos jovens promissores do feudo, manter constantemente ativas as defesas arcanas territoriais e assegurar a estrita observância das leis do Reino dentro de nossa jurisdição.

Fez uma pausa significativa, dirigiu-me um olhar penetrante e sorriu com genuína sabedoria:

— Contudo, o que verdadeiramente importa, Elian, não é o título em si, mas o uso que se faz do poder conferido. Um título desprovido de honra assemelha-se a uma espada sem gume. Serve apenas como objeto de ostentação vazia.

Prosseguiu então sua explicação, após examinar algumas páginas adicionais do compêndio:

— Na estrutura hierárquica da Nobreza Arcana, existem títulos que, diferentemente dos tradicionais, não são transmitidos por herança, mas conquistados através de sacrifício pessoal, esforço extraordinário e comprovado domínio das artes arcanas.

Indicou uma ilustração detalhada que apresentava diversos símbolos e brasões de aparência ancestral:

— O primeiro degrau desta hierarquia é precisamente o Baronete Arcano. Esta distinção é outorgada àqueles que alcançam o Nível Chama em potencial arcano e prestam serviços de relevância inquestionável ao reino — particularmente na defesa de seus territórios estratégicos. Foi através deste caminho que obtive meu título atual.

Realizou uma breve interrupção, seu olhar momentaneamente distante, como se revisitasse mentalmente os campos de batalha do passado.

— Imediatamente acima encontra-se o Barão Arcano. Esta distinção exige, no mínimo, o domínio do Nível Chama, porém habitualmente é concedida exclusivamente àqueles que atingem o Rugido e obtêm vitórias decisivas em contextos bélicos. Representa uma condecoração de origem diretamente real, associada a feitos que alteram significativamente o curso de confrontos militares importantes.

Virando cuidadosamente a página seguinte, continuou sua exposição:

— Visconde de Essência. Trata-se de um título particularmente raro, reservado aos praticantes que demonstram pleno domínio do Nível Tempestade. São arcanistas que assumem a proteção de territórios de importância estratégica fundamental e contribuem para a estabilidade do reino através de sua presença poderosa.

— O Marquês do Fluxo ocupa a posição subsequente. Para esta distinção, a mera posse de poder arcano não é suficiente — exige-se comprovada capacidade de comando. Geralmente, apenas aqueles que lideraram campanhas militares com resultados excepcionais e demonstraram maestria tanto nas artes arcanas quanto na estratégia militar são considerados dignos deste título.

Ele então deteve-se com particular atenção na página seguinte, onde se exibia um brasão de imponência notavelmente superior:

— O Arquiduque Arcano... Este título aproxima-se quase do âmbito lendário. Requer que o praticante tenha alcançado o extraordinário Nível Ascensão. Esta distinção é excepcionalmente rara e confere ao seu portador autonomia praticamente absoluta sobre extensas regiões territoriais. Embora formalmente subordinado à autoridade real, governa com prerrogativas quase soberanas.

Finalmente, fechou o livro com movimento deliberadamente lento:

— E, transcendendo todos os anteriores, existe o Guardião da Coroa. Esta não é uma distinção que se obtém exclusivamente através do poder arcano — constitui uma nomeação direta e pessoal do próprio monarca. Representa o equilíbrio delicado entre a Nobreza Arcana e a própria instituição da Realeza. Funciona simultaneamente como instrumento ofensivo e defensivo do trono.

Fixou seu olhar diretamente no meu, transmitindo com firmeza:

— Estes títulos não são meras designações honoríficas, Elian. Cada um deles incorpora responsabilidades de magnitude extraordinária. Ser reconhecido como Nobre Arcano não representa privilégio — constitui um dever sagrado perante o reino.

— Então, mesmo possuindo tais poderes consideráveis, ainda assim não somos plenamente aceitos pela chamada Nobreza de Sangue-Puro? — questionei, esforçando-me para compreender as intrincadas camadas de orgulho e tradição que permeavam o mundo ao qual eu agora pertencia, mas cujas nuances ainda não assimilara completamente.

Meu pai fechou o livro com um suave estalo característico, depositando-o sobre a mesa com gestos que denotavam certa solenidade. Seu olhar, ainda parcialmente fixo na representação do Arquiduque, adquiriu uma dureza perceptível.

— Precisamente. Para eles, a linhagem ancestral permanece como valor supremo. — Recostou-se em sua cadeira, cruzando os braços em postura reflexiva. — Pouco importa se um Arcanista ascende aos mais elevados patamares de poder através de sua própria alma e esforço extraordinário. Na perspectiva dos Sangue-Puro, tal conquista permanece intrinsecamente inferior ao que denominam "direito de nascença".

Minha mãe, que até aquele momento mantivera-se como observadora silenciosa de nossa conversa, interveio com voz serena, porém carregada de verdade:

— Muitos deles ainda nos consideram como anomalias inquietantes. Como se o dom arcano representasse uma dádiva inerentemente instável, potencialmente perigosa, fundamentalmente imprevisível. Algo que deveria ser objeto de estudo científico, mantido sob vigilância constante... e jamais dignificado com títulos de origem real.

Meu pai confirmou com um breve movimento afirmativo de cabeça.

— Quando recebi oficialmente a nomeação como Baronete Arcano, não faltaram manifestações de protesto. Correspondências anônimas carregadas de ameaças veladas. Olhares de desaprovação explícita durante todas as audiências oficiais. O reconhecimento formal originou-se do soberano, mas o desprezo emanou diretamente da corte.

— Mas o senhor salvou duas comunidades inteiras! Preservou as vidas de centenas de súditos inocentes! — exclamei, sentindo genuína indignação perante tal injustiça.

Ele esboçou um sorriso, porém era um sorriso evidentemente amargo, desprovido de verdadeira alegria.

— Infelizmente, nem sempre os atos heroicos possuem mais peso que um sobrenome de origem ancestral.

Um silêncio denso e significativo estabeleceu-se entre nós.

Ele então inclinou-se ligeiramente para frente, com olhar intensamente fixado no meu:

— É precisamente por isso que você precisa compreender profundamente, Elian. Nossa natureza difere fundamentalmente da deles. Não recebemos respeito pelo simples fato de nosso nascimento. Conquistamos respeito através de nossas ações concretas. E isso implica necessariamente que devemos realizar mais, suportar provações maiores... e jamais demonstrar submissão.

— E se eventualmente eu conseguir alcançar o extraordinário nível Ascensão? — indaguei, com voz deliberadamente baixa, porém inabalável em sua firmeza.

Ele me contemplou com um brilho especial no olhar — algo que mesclava orgulho paterno e uma sutil melancolia.

— Nesse caso, eles serão forçados a reconhecer o nome Freimann. Independentemente de sua vontade.

— Ou nos respeitarão por mérito... ou nos temerão por poder. — complementou minha mãe, em tom aparentemente sereno, mas impregnado de profundo significado.

— Então absolutamente todos os nobres pertencentes à categoria Sangue-Puro rejeitam nossa legitimidade? — questionei, sentindo uma indignação crescente em meu íntimo.

Meu pai, dirigindo-me um olhar penetrante e incisivo, respondeu com precisão:

— Não necessariamente. É inegável que uma expressiva maioria mantém essa postura discriminatória, entretanto, existem exceções... uma determinada facção dentro da própria Nobreza de Sangue-Puro que demonstra simpatia por nossa causa.

Realizou uma breve pausa reflexiva, reabriu o livro e deteve-se em uma página específica que exibia um brasão particularmente elaborado. Então prosseguiu:

— Nosso feudo está situado em território administrado por um conde que não compartilha desse preconceito arraigado. — Girou o livro em minha direção e indicou o brasão representado: uma espada envolta por chamas e raios, encimada por uma águia majestosa, com espigas de trigo emoldurando harmoniosamente todo o conjunto simbólico.

— Nosso condado encontra-se atualmente sob a administração da Casa Stein. Nem sempre foi assim, mas já se passaram diversos anos desde que assumiram o controle governamental desta região.

— Quem exercia o governo territorial anteriormente? — indaguei, manifestando natural curiosidade.

— Esta informação lhe será revelada no momento apropriado. Ainda não é oportuno. — Ele cerrou brevemente os olhos, num gesto que sugeria a existência de um passado carregado de complexidades. — Mas, retornando ao ponto central: nem todos os Nobres de Sangue-Puro manifestam atitudes preconceituosas. Os membros da Casa Stein, além de pertencerem legitimamente à categoria Sangue-Puro, também cultivam valores tradicionalistas em relação às Artes Arcanas.

— Agora que mencionou este aspecto... qual o destino reservado aos descendentes das famílias Sangue-Puro que nascem naturalmente dotados de talentos arcanos?

— Estes são plenamente aceitos em seu círculo. Constituem a exceção bem-vinda à regra geral. O preconceito deles dirige-se especificamente contra aqueles que não ostentam o distintivo "Von" em sua nomenclatura.

"Von?" — refleti internamente, franzindo ligeiramente o cenho em expressão de dúvida.

Meu pai, observando atentamente minha reação, percebeu minha expressão interrogativa. Então esclareceu:

— Todos os membros legítimos da Nobreza de Sangue-Puro incorporam o elemento "Von" como componente integral de seu nome. Trata-se de um título de origem ancestral, que simboliza a pureza ininterrupta de sua linhagem. Este é precisamente o elemento que estabelece a distinção formal entre eles e nós. Para exemplificar: Conde Albert Von Stein — este é o nome completo do atual conde que administra nossa região territorial.

Fechou o livro com movimento deliberadamente lento e conclusivo.

— Ser reconhecido como Arcanista, independentemente do nível de poder que eventualmente alcance, ainda é considerado uma condição que exige constante comprovação de mérito. Entretanto, esta realidade jamais constituiu impedimento para nossa ascensão legítima, Elian. Absolutamente nunca.

E naquele momento significativo, mesmo ainda habitando um corpo infantil, compreendi com clareza surpreendente: carregar o potencial das artes arcanas representava simultaneamente um fardo considerável e uma chama de possibilidades. Mas, transcendendo estas dimensões — constituía fundamentalmente uma promessa de transformação.

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